Dimensão Histórica
A Dimensão Histórica no trabalho é representada pela Rua Direita e pela Estrada de Ferro. A seguir, um breve histórico do município, evidenciando o quão importante foram para a formação da paisagem histórica do lugar.
Breve Histórico
Os primeiros indícios de habitação em Passa Quatro datam do final do século XVII (CARNEIRO, 1988). A região como um todo sempre foi porta de entrada para o Sertão das Minas Gerais, para expedições em busca de índios em um primeiro momento e, posteriormente, ouro e metais preciosos (ARAÚJO, 2008). A travessia da Serra da Mantiqueira ocorria pela Garganta do Embaú, uma espécie de vale entre as montanhas, facilmente identificável ao longe, e logo ali, ao atravessar esse vale logo se encontrava Passa Quatro. Este local era a porta de entrada para Minas Gerais, estava portanto dentro da rota do Caminho Velho da Estrada Real que ligava Ouro Preto-MG a Paraty-RJ. Nesse período Passa Quatro ainda era apenas uma localidade.
PATRIMÔNIO HISTÓRICO - Considerando toda a carga histórica da cidade de Passa Quatro e o vínculo que a população tem com o lugar, sempre se pautou pela preservação do centro histórico, assim como de algumas tradições do município. Dessa forma, por iniciativa da Prefeitura, em 1999 realizou-se o primeiro tombamento em nível municipal, que foi da edificação que abrigou o Banco Hipotecário e Agrícola do Estado de Minas Gerais, onde hoje funciona a Casa da Cultura de Passa Quatro.
Em 1995/96 o governo do Estado de Minas instituiu o ICMS Cultural, através dele repassa recursos especificamente para a gestão do patrimônio mineiro. O Instituto Estadual do Patrimônio Artístico e Histórico (IEPHA) é o órgão que estabelece os critérios para repasse De forma simplificada, funciona num sistema de pontuação: quanto mais ações e investimentos voltados à manutenção e preservação do patrimônio o município realiza (dossiês de tombamentos e registro, projetos de educação patrimonial, funcionamento do Conselho Municipal), mais pontos ele acumula e maior é o repasse para ser investido na área cultural.
Após a instalação dessa política pelo Estado de Minas, os processos de tombamento se tornaram mais frequentes: tombamento do calçamento do núcleo histórico (2005), residência dos Scianni6 (2005), Estação Ferroviária Central2 (2006), residência da Fiuca7 (2006), edifício onde funcionou a Coletoria Estadual1 (2006), residência de Pedro Mossi4 (2006), tombamento do núcleo histórico (2008), tapetes de Corpus Christi (2010-imaterial), edifício da Câmara Municipal3 (2016) e recentemente foi tombado, pelo IEPHA, o túnel da ferrovia localizado na divisa entre os estados de Minas e São Paulo, palco das Revoluções de 1930 e 1932.
Em razão do incentivo do ICMS Cultural, Passa Quatro tem uma vasta quantidade de material sobre patrimônio histórico da cidade. Praticamente todas as edificações históricas do município foram inventariadas, seja da área central, seja dos distritos e da área rural, algumas possuindo fichas mais completas, outras mais sucintas.
Uma consideração a se fazer é que a consciência de preservação patrimonial não é fruto somente das ações governamentais, o sentimento de pertencimento da população com o lugar é muito grande e isso se reflete na cidade, no valor que se dá às edificações, às praças e na ampla documentação iconográfica e textual sobre Passa Quatro.
ESTRADA DE FERRO MINAS E RIO - Em 1874 o governo da Província de Minas expediu uma lei autorizando a construção de uma ferrovia que adentrasse o sul de Minas Gerais, acompanhando o vale do Rio Verde. No ano de 1875 a concessão foi dada ao Governo Imperial, que firmou acordo com uma companhia inglesa para a construção da estrada de ferro. O ponto inicial da linha seria em Cruzeiro, no estado de São Paulo, onde cruzaria a serra, e teria seu término em Três Corações, Minas Gerais. A obra iniciou em 1881 e encerrou em 1884, sendo a primeira estrada de ferro a adentrar o sul de Minas (CASTILHO, 2012). A estrada percorre um total de 170 km, passando, além dos pontos inicial e final em Perequê, Passa Quatro, Capivari (atualmente Itanhandu), Pouso Alto, Fazendinha (Carmo de Minas), Soledade e Contendas (Conceição do Rio Verde).
A estrada de ferro Minas e Rio foi altamente lucrativa, pois conectava uma região que até hoje é produtora de café numa época em que este despontava como o grande produto de exportação nacional. Pela estrada férrea escoava ainda parte da produção agropecuária e a produção de fumo, em franca expansão desde os anos de 1865. Juntamente com o café, estes foram os grandes produtos de exportação do Sul de Minas (CASTILHO, 2012).
A INDUSTRIA FUMAGEIRA - Com a ferrovia, não somente se intensificaram as movimentações, o ir e o vir, mas a máquina também trouxe novas possibilidades de convivência social: novas pessoas, novas tradições culturais, com a chegada dos imigrantes italianos, portugueses, ingleses e franceses, assim como uma vida urbana mais intensa. A instalação da linha férrea também promoveu a expansão da indústria fumageira, que juntos garantiram o crescimento econômico e urbano de Passa Quatro. Segundo Carneiro (1988), “o cultivo e o comércio de fumo foi o nosso primeiro patrimônio. A incalculável riqueza que o fumo trouxe a Passa Quatro, ainda hoje, é desfrutada pelos seus habitantes. O comércio do fumo fez de Passa Quatro um nome conhecido em todo o país.” A esse fato a autora faz referência ao ano de 1891, no qual três fumeiros (fabricantes de fumo) passaquatrenses receberam menção honrosa na Exposição Brasileira Preparatória da Universal de Paris. Posteriormente, em 1908, o fumo de Passa Quatro foi condecorado com medalha de prata na Exposição Internacional do Rio de Janeiro.
Mapa da Rede Sul Mineira, posteriormente integrada a Rede Ferroviária Federal (RFFSA) (Castilho, 2012 modificado pela autora)
Dentro deste contexto, com a chegada da ferrovia, Passa Quatro começa a se desenvolver, principalmente com as atividades relacionadas ao comércio, a produção e ao beneficiamento do fumo, não tanto com café, que não chegou a ser produzido na área. O município, impulsionado pela ferrovia emancipou-se em 1888, apenas quatro anos após a inauguração desta, sendo o primeiro dos demais que se emanciparam de Pouso Alto: Carmo de Minas em 1901, Itanhandu em 1923, Itamonte em 1938, São Lourenço em 1927 e São Sebastião do Rio Verde em 1963.
Em 1916 havia 19 armazéns de fumo na cidade. Em 1927 esse número subiu para 40 armazéns e esse fato se refletiu na cidade, já que várias das edificações ainda hoje existentes foram antigos armazéns de fumo. Vale ressaltar que no ano de 1920 metade das terras cultivadas eram ocupadas por fumais (MOSSRI, 1998).
A malha urbana foi se expandindo, a partir da Rua Direita. Surgiram as praças públicas, principalmente após os anos 1920, o cinema (1913), o Teatro Club (1922), o telefone (1921), a eletricidade (1910). A cidade passa a viver sob a nova ótica da modernidade. Em 1941 foi declarada Estância Hidromineral. Contígua à mina d'água denominada Fonte Padre Manoel foi construído um hotel e a empresa de mineração e engarrafamento de água e, a partir desse momento Passa Quatro começa a se firmar como local de turismo e descanso.
Após a Segunda Guerra Mundial, com a expansão da indústria do cigarro, o fumo de rolo cai em desuso e com ele também a produção em Passa Quatro. Não se produziu mais fumo: as únicas lembranças que ele deixou foram justamente no tecido urbano, as praças, as edificações, os armazéns e as vendas que marcam a cidade até hoje.
Evolução da Rua Direita (Tenente Viotti)